Neofobia alimentar

Neofobia alimentar

A alimentação pode parecer uma atividade simples, mas é um processo complexo que requer a interação eficiente tanto do sistema nervoso central quanto do sistema nervoso periférico. Sendo assim, qualquer alteração nesses sistemas, somados à parte genética e psicossocial, pode conduzir à neofobia alimentar.

A neofobia é uma tendência da criança para rejeitar ou relutar em experimentar alimentos novos e desconhecidos, podendo afetar significativamente suas escolhas alimentares, moldando preferências gustativas e influenciando significativamente a qualidade da sua dieta.

Desenvolvimento

O período mais sensível para se desenvolver o comportamento neofóbico é observado em crianças com 2 anos de idade, mas eles costumam se intensificar também, frequentemente, entre os 18 e os 24 meses de idade, pois se relacionam com o aumento da mobilidade da criança.

Ela é considerada um estágio natural de desenvolvimento, não requerendo muitas vezes um tratamento ou terapia. No entanto, requer acompanhamento por um especialista e orientação dos pais, pois a resistência da criança em comer certos alimentos também pode ser condicionada à introdução tardia de novos itens na dieta por medo dos cuidadores em implementá-los ou por exclusão de um ou outro devido à recusa em uma primeira prova. É aconselhável o acompanhamento justamente para orientar os testes de novos alimentos na fase da janela de oportunidade, onde há maior abertura para provar sabores desconhecidos, ocorrendo em bebês de até 12 meses de idade.

Causas

As causas desse período não são completamente conhecidas, porém fatores genéticos podem influenciar a escolha alimentar, envolvendo receptores gustativos que podem interferir na percepção diferencial dos sabores doce ou amargo, dependendo das diferenças em genes individuais. Assim, algumas crianças podem ser mais tolerantes ao sabor de vegetais verdes mais amargos, como brócolis ou repolho, enquanto outras, rejeitarão esses alimentos só de vê-los.

Além disso, o ambiente social e a família também podem contribuir com a rejeição de alimentos. As crianças tentem a observar e imitar o que veem, sendo assim, o exemplo em casa/escola pode ser um fator que molde suas escolhas alimentares.

Consequências

As consequências da neofobia alimentar podem ser significativas para a saúde e o bem-estar. A restrição de alimentos pode levar a deficiências nutricionais importantes, especialmente de vitaminas e minerais, já que a variedade de nutrientes obtidos por meio da dieta é bastante reduzida. Isso é evidenciado por numerosos estudos que relatam, que crianças neofóbicas comem menos do que os níveis recomendados de vegetais, frutas e laticínios. Além disso, as crianças que comem apenas produtos selecionados podem não adquirir algumas das habilidades associadas à alimentação rápida, especialmente se consomem apenas alimentos com textura macia ou em consistência de mingau.

Há também uma forte possibilidade de a criança experimentar monotonia alimentar, limitando seu o prazer e o seu interesse nas refeições. A longo prazo, essa rejeição e limitação dietética pode contribuir para o desenvolvimento de doenças crônicas, como obesidade, diabetes tipo 2 e doenças cardiovasculares.

Diagnóstico

O diagnóstico pode ser feito a partir das características sensoriais, que têm sido apontadas como um dos determinantes mais influentes do comportamento alimentar, e dentre essas, as texturas são o principal motivo de rejeição ou aceitação alimentar em crianças.

No processo de diagnóstico relacionado às dificuldades alimentares, existem escalas de pontuação que podem ser usadas, como o uso da Montreal Children’s Hospital Feeding Scale (MCH-FS). A escala MCH se relaciona à alimentação infantil é a primeira desse tipo a ser usada para triagem de crianças com dificuldades alimentares, tanto para prevenção quanto para diagnóstico. Pode ser usada como uma ferramenta para identificar possíveis dificuldades alimentares em crianças de 6 meses a 6 anos de idade. Ela consiste em 14 perguntas que abordam questões relacionadas ao padrão da refeição, avaliação do apetite, duração da refeição, problemas na esfera orofacial ou a percepção dos pais sobre o peso e a altura corretos da criança.

Tratamento

Contudo o tratamento da neofobia alimentar requer uma abordagem multidisciplinar, envolvendo nutricionistas, psicólogos e outros profissionais de saúde.

Utilizar o método de cadeia alimentar, onde inicialmente, a dieta deve ser baseada em produtos conhecidos da criança, mas de forma diferente da anterior (por exemplo, mudar a forma de apresentação) ou alterar a forma de administração (por exemplo, cortar a fruta em vez de triturar e amassar) pode ser uma excelente estratégia. Esses alimentos são tratados como já conhecidos do paciente, sendo mais fáceis de serem aceitos, mas é preciso mudar gradativamente a forma de oferta, mudando a rotina e começando a introduzir outros alimentos juntamente com estes.

Durante o tratamento, podem ser utilizados dispositivos disponíveis, incluindo colheres ou garfos em forma de animal, tigelas, pratos com personagens de contos de fadas ou heróis e princesas e livros sobre o tema da alimentação. Também é necessário garantir um clima positivo durante as refeições (por exemplo, não reclamar por comer pouco, não fazer comparações com outras crianças, não usar recompensas em forma de doces por comer novos produtos), estimulando a criança a se divertir um pouco mais naquele ambiente e se familiarizar com os alimentos, perdendo o receio de prová-los.

Outras formas de tratamento

Também é uma boa estratégia permitir que as crianças participem da preparação das refeições, pois isso influencia na sua preferência por alimentos, reduzindo o sentimento de ansiedade e constrói relacionamentos positivos com seus pais e familiares.

Além disso, crianças que ajudam a cozinhar em casa, apresentam com mais frequência uma preferência por experimentar frutas e verduras.

Educação alimentar

Sendo assim, a educação alimentar e nutricional torna-se uma ferramenta fundamental no tratamento da neofobia alimentar, por possibilitar um processo ativo, lúdico e interativo, com incentivo às experiências prévias, facilitando a adoção voluntária de hábitos alimentares ou de qualquer comportamento relacionado à alimentação que conduza à saúde e ao bem-estar. Além disso, tem como vantagem a fácil aplicação e o baixo custo, podendo ser aplicada individualmente ou no ambiente escolar, por exemplo.

Há, também, a educação alimentar com base sensorial, a qual se mostra promissora na intervenção de respostas neofóbicas, tendo apoio de profissionais de terapia ocupacional e fonoaudiólogos. Esse tipo de atividade estimula a curiosidade por novas formas, cores e texturas, podendo contribuir para o suporte emocional e o encorajamento necessário ao cuidado da criança com atitudes de fobia alimentar, quando aplicada em um ambiente propício e reconfortante.

Resumo

Em resumo, a neofobia alimentar é um desafio comum, principalmente na infância, mas pode persistir na fase adulta caso não seja acompanhada e tratada. A compreensão dos fatores que influenciam o desenvolvimento dessa aversão a novos alimentos e a implementação de estratégias eficazes são cruciais para garantir uma dieta saudável e diversificada, evitando deficiências nutricionais importantes que podem impactar no seu crescimento e desenvolvimento.

O tratamento multidisciplinar, com a participação de nutricionistas, psicólogos, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos e outros profissionais de saúde, é fundamental para auxiliar os pacientes a superar a neofobia alimentar e melhorar sua qualidade de vida.

Referências:

  • Białek-Dratwa A, Szczepańska E, Szymańska D, Grajek M, Krupa-Kotara K, Kowalski O. Neophobia-A Natural Developmental Stage or Feeding Difficulties for Children? Nutrients. 2022 Apr 6;14(7):1521. doi: 10.3390/nu14071521. PMID: 35406134; PMCID: PMC9002550.
  • Predieri S, Sinesio F, Monteleone E, Spinelli S, Cianciabella M, Daniele GM, Dinnella C, Gasperi F, Endrizzi I, Torri L, Gallina Toschi T, Bendini A, Pagliarini E, Cattaneo C, Di Monaco R, Vitaglione P, Condelli N, Laureati M. Gender, Age, Geographical Area, Food Neophobia and Their Relationships with the Adherence to the Mediterranean Diet: New Insights from a Large Population Cross-Sectional Study. Nutrients. 2020 Jun 15;12(6):1778. doi: 10.3390/nu12061778. PMID: 32549267; PMCID: PMC7353239.
  • Torres T de O, Gomes DR, Mattos MP. FACTORS ASSOCIATED WITH FOOD NEOPHOBIA IN CHILDREN: SYSTEMATIC REVIEW. Rev paul pediatr [Internet]. 2021;39:e2020089. Available from: FACTORS ASSOCIATED WITH FOOD NEOPHOBIA IN CHILDREN: SYSTEMATIC REVIEW

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Back To Top