Desde o momento em que uma mulher descobre que está grávida, uma série de cuidados especiais passa a fazer parte de sua rotina, e a amamentação é, sem dúvida, um dos aspectos mais importantes desta jornada. O leite materno é uma dádiva da natureza, oferecendo inúmeros benefícios para o bebê em crescimento. Apesar dos debates e questionamentos atuais em torno do aleitamento materno, a história registra sua relevância milenar para o desenvolvimento dos bebês.
Diversas culturas ao longo dos tempos valorizaram e documentaram a importância do “leite genuíno”, como exemplificado na passagem bíblica de I Pedro 2:2, ao citar que “Desejai ardentemente para as crianças recém-nascidas o leite genuíno, não falsificado, para que por ele vades crescendo”. Hipócrates alertava sobre os objetivos da amamentação, defendendo que apenas o leite da própria mãe seria benéfico e seguro para a criança, sendo de outras maneiras perigoso. No século XVIII observou-se a expansão da prática de aleitamento cruzado, com o envio de crianças a amas de leite, que trouxe consigo um aumento alarmante de mortes infantis relacionadas a doenças transmitidas por essas amas.
Essas referências históricas ressaltam a importância ancestral do leite materno e reforçam a necessidade de apoiar e valorizar as mães em sua jornada de amamentação para garantir o bem-estar das futuras gerações. Em resumo, é compreendido desde os registros iniciais da civilização a verdadeira relevância do leite materno, que é a fórmula do desenvolvimento, enriquecida com benefícios inestimáveis para a saúde física e emocional do bebê.
A importância do leite materno
O leite materno é considerado o alimento ideal para os recém-nascidos e lactentes, sendo a melhor fonte de nutrientes essenciais para o crescimento e desenvolvimento saudável do bebê. O Guia Alimentar para População Brasileira menor de 2 anos recomenda a amamentação até os dois anos de idade, sendo esta exclusiva nos primeiros seis meses de vida do bebê. Um dos principais benefícios do leite materno é a presença de anticorpos que fortalecem o sistema imunológico do bebê, protegendo-o de diversas doenças, como infecções respiratórias e gastrointestinais. Além disso, o leite materno é facilmente digerido pelo sistema digestivo do bebê, o que reduz o risco de desconfortos e alergias alimentares.
Os primeiros dois anos de vida são de extrema importância para o crescimento e desenvolvimento da criança, pois têm implicações que se estendem por toda a vida. Nesse período, a amamentação desempenha um papel fundamental, uma vez que pode prevenir o surgimento de diversas doenças ao longo da vida adulta. O ato de amamentar é um investimento valioso na prevenção de doenças e bem-estar futuros do indivíduo.
O leite materno e o desenvolvimento cognitivo do bebê
O impacto positivo do leite materno no desenvolvimento do bebê vai além do aspecto nutricional e imunológico. Estudos científicos têm revelado uma relação significativa entre a amamentação e o desenvolvimento cognitivo da criança.
- Fatores de crescimento e desenvolvimento
Em uma pesquisa realizada, foi constatado que a frequência mais alta de refeições com leite materno e a amamentação exclusiva durante o primeiro ano de vida estão diretamente relacionadas a resultados positivos nas medidas de Desenvolvimento Infantil das Escalas Bayley.
Essas medidas incluíram um melhor desempenho em áreas como memória, linguagem precoce e habilidades motoras, aos 14 e 18 meses de idade. É relevante destacar que os benefícios cognitivos da amamentação nos primeiros dois anos de vida têm se mantido ao longo da infância e da adolescência. Um estudo randomizado realizado com 13.889 crianças apontou fortes evidências associando o aleitamento prolongado com o desenvolvimento cognitivo das crianças.
- Composição nutricional única
O leite materno contém ácidos graxos poliinsaturados de cadeia longa essenciais, presentes no leite humano mas normalmente ausente nas fórmulas, como o ácido docosahexaenoico (DHA) e o ácido araquidônico (ARA), que desempenham um papel crucial no desenvolvimento do sistema nervoso central. O DHA é fundamental para a formação e o funcionamento das células cerebrais, sendo um dos principais componentes estruturais do cérebro. Durante as duas primeiras semanas de vida, os bebês produzem uma quantidade limitada de DHA, mas ainda não são capazes de produzir quantidades adequadas por si só até aproximadamente os 6 meses de idade. Isso indica a existência de uma fase crítica no desenvolvimento em que o cérebro humano e o desenvolvimento cognitivo podem ser particularmente sensíveis aos ácidos graxos poliinsaturados de cadeia longa fornecidos pelo leite materno.
- Vínculo emocional e estímulo cognitivo
A amamentação não é apenas uma forma de nutrição; ela também promove um vínculo emocional poderoso entre a mãe e o bebê. O contato pele a pele durante a amamentação libera ocitocina, o “hormônio do amor”, que além de estimular a produção de leite, fortalece o apego entre mãe e filho. Acredita-se que esse vínculo emocional seguro proporciona ao bebê uma sensação de conforto e segurança, essencial para o desenvolvimento cognitivo saudável. Além disso, o ato de amamentar permite que o bebê esteja em contato próximo com o rosto da mãe, proporcionando estímulos visuais e auditivos que também são importantes para o desenvolvimento cerebral.
Ou seja, o leite materno é um recurso precioso da natureza que nutre, protege e impulsiona o desenvolvimento cognitivo do bebê. Seus benefícios vão muito além da nutrição, pois é uma fonte incomparável de nutrientes essenciais, anticorpos e fatores de crescimento que contribuem para a saúde e o bem-estar da criança.
Desta forma, é essencial que a sociedade apoie e incentive a amamentação, oferecendo o suporte necessário às mães para que possam proporcionar o melhor alimento possível a seus filhos, o leite materno. Investir na promoção do aleitamento materno é um investimento no futuro das gerações, pois isso não só influencia positivamente o desenvolvimento cognitivo, mas também emocional e físico das crianças. É fundamental que governos, instituições de saúde e a sociedade em geral se unam para criar um ambiente propício para a amamentação, garantindo que todas as mães tenham acesso a informações, apoio e condições adequadas para oferecer esse presente inestimável aos seus filhos.
Referências:
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