O pão é um alimento tradicional que tem sido consumido há milhares de anos em diversas culturas ao redor do mundo. No entanto, nos últimos anos, surgiram muitos debates sobre o pão ser um vilão na alimentação ou não.
Alguns argumentam que o pão deve ser evitado porque é rico em carboidratos e pode contribuir para o ganho de peso ou outras condições correlatas à saúde. Já outros afirmam que o pão é uma parte importante de uma dieta saudável e equilibrada.
Para entender se o pão é um vilão na alimentação, é importante considerar vários fatores, incluindo a composição nutricional do pão, a quantidade ingerida, o papel do pão na dieta em geral e a composição geral da alimentação de um indivíduo.
Em termos de composição, o pão é geralmente feito com farinha, água, fermento e sal. Alguns pães também podem conter outros ingredientes, como açúcar, óleo ou conservantes. O tipo de farinha utilizada no pão também pode variar, sendo as farinhas refinadas mais comuns de serem utilizadas e consumidas, provavelmente devido a facilidade de acesso e custo, enquanto as farinhas integrais, que contêm mais fibras, são menos utilizadas e tornam o produto final mais caro.
O carboidrato é o principal macronutriente encontrado no pão e seu teor pode variar dependendo do tipo de pão. Além disso, contém uma pequena quantidade de proteínas e gorduras.
Embora o pão tenha em sua maior proporção carboidratos, isso não significa que ele seja ruim para a saúde, já que este é um macronutriente essencial, a principal fonte energética das nossas células e é necessário para o funcionamento adequado do metabolismo.
No entanto, a ingestão excessiva de calorias, que ocorre principalmente pela ingestão excessiva de carboidratos refinados e gorduras (principalmente através alimentos com alta densidade calórica como fast foods, refrigerantes, doces, etc), pode levar ao ganho de peso e outras condições de saúde, como a resistência à insulina e o diabetes tipo 2.
Por esse motivo, assim como qualquer outro alimento rico em carboidratos, o consumo precisa ser aconselhado dentro de um contexto equilibrado e em quantidades adequadas para as necessidades energéticas do indivíduo.
No geral, os pães integrais são geralmente mais nutritivos do que os pães brancos refinados. Isso ocorre porque os pães integrais contêm o grão do cereal integral, o que assegura uma maior quantidade de fibras. As fibras, por sua vez, são associadas com uma menor resposta glicêmica, maior saciedade e melhora da saúde intestinal.
Uma meta-analise identificou reduções de 21%, 16%, 11% e 18%, respectivamente, no risco relativo de doença coronariana, doença cardiovascular, câncer total e todas as causas de mortalidade para a categoria mais alta em relação a ingestão mais baixa de grãos integrais. Os resultados positivos incluíam na maioria uma ingestão de 3 porções de alimentos fontes de grãos integrais (sendo 1 porção equivalente a 1 fatia de pão integral, por exemplo).
Outra meta-analise identificou que o risco relativo para desenvolver diabetes tipo 2 foi de 0,68 para ingestão de 3 porções por dia de grão integrais, em relação a 0,95 para grãos refinados.
Vale ressaltar que a maioria dos estudos que seguem um padrão alimentar que incluía pão não foi associada a um aumento significativo da adiposidade abdominal ou geral. No entanto, o consumo de pão integral foi mais benéfico do que o pão refinado, principalmente em relação à gordura abdominal. Isto pode estar relacionado aos componentes presentes nos grãos integrais e também ao que chamamos de matriz alimentar.
Entretanto, isso não significa que o pão refinado seja ruim, isso porque existem outras formas de contornar as questões relacionadas a resposta glicêmica, teor de fibras, saciedade e melhora da saúde intestinal.
Os outros componentes da refeição que acompanham o pão também são muito importantes. Ao escolher uma boa fonte de proteína (como ovos, frango desfiado, atum e carne) e associar uma porção de fruta junto com uma porção de alimentos fontes fibras (como aveia, psyllium ou chia), é possível encaixar o pão refinado dentro um contexto saudável.
Considerar essa perspectiva é importante porque a mudança para o pão integral pode ser desafiadora e, muitas vezes, prejudicar a adesão ao cardápio, principalmente daqueles pacientes com “paladar infantil”. É papel do Nutricionista analisar o contexto do paciente, informar e fazer a prescrição de forma assertiva.
Um ensaio clínico que comparou a ingestão de pão branco enriquecido ou não com vegetais identificou uma melhor sensação de saciedade pelos participantes ao ingerir o pão branco enriquecido com vegetais.
Outro ensaio clínico identificou que o consumo do café da manhã rico em proteínas antes da ingestão de pão branco (porção referente a 50g de carboidratos) atenuou o aumento na resposta pós-prandial da glicose sérica (P < 0,0001) e resultou em menor curva glicêmica (P < 0,0001), índice glicêmico (P = 0,0096) e carga glicêmica (P = 0,0101) do que os cafés da manhã com alto teor de carboidratos e alto teor de gordura.
Em resumo, o pão não é necessariamente um vilão na alimentação, mas a sua composição nutricional, a quantidade e a forma como é consumido devem ser consideradas. Os pães integrais são geralmente mais nutritivos do que os pães brancos refinados, e o tamanho das porções de pão deve ser limitado para evitar o excesso de carboidratos e calorias.
Além disso, o pão deve ser acompanhado por alimentos saudáveis a fim de garantir uma dieta equilibrada. Utilizar de estratégias para melhorar a resposta de pão branco ao organismo também pode ser uma ótima opção para aumentar a adesão a dieta, visto que é a versão do pão mais consumida.
Em última análise, a escolha do pão na alimentação depende do estilo de vida, preferências alimentares e necessidades nutricionais de cada indivíduo. Se consumido com moderação, inteligência e escolhendo opções mais saudáveis, o pão pode ser uma parte importante e saborosa de uma dieta equilibrada.
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