Nutrição e alzheimer (prevenção e tratamento)

Nutrição e alzheimer (prevenção e tratamento)

O Alzheimer é uma doença neurodegenerativa progressiva que afeta a linguagem, memória, compreensão, atenção, julgamento e raciocínio de um indivíduo. É a forma mais comum de demência, representando pelo menos dois terços dos casos de demência em pessoas com 65 anos ou mais. Possui um início insidioso e comprometimento progressivo, representando um desafio crescente para a saúde pública em todo o mundo.

Neste contexto, a Nutrição desempenha um papel importante tanto na prevenção quanto no tratamento do Alzheimer. Neste artigo, discutiremos os conceitos e a fisiopatologia do Alzheimer, dados epidemiológicos relevantes, a relação entre os níveis de glicose no sangue e o Alzheimer, além de explorar como a Nutrição pode auxiliar tanto na prevenção quanto no tratamento dessa doença.

Conceitos e Fisiopatologia do Alzheimer

Essa condição envolve mudanças nas células e substâncias químicas do cérebro que levam ao seu desenvolvimento e progressão.

É caracterizada pela formação de placas de proteína beta-amiloide e emaranhados neurofibrilares, que resultam na perda de células nervosas e no declínio das funções cognitivas. Os emaranhados neurofibrilares são filamentos formados por proteínas tau hiperfosforiladas, enquanto as placas nada mais são do que lesões microscópicas esféricas, que possuem um núcleo de peptídeo beta-amilóide extracelular (derivado de uma proteína transmembrana, conhecida como proteína precursora de amilóide – APP). Essas mudanças danificam as células e levam a problemas de comunicação no cérebro. Os emaranhados neurofibrilares são encontrados em áreas específicas do cérebro, como o hipocampo e a amígdala, enquanto as placas de amiloide β têm uma distribuição mais ampla pelo córtex cerebral.

A ativação das células microgliais também desempenha um papel importante na progressão da doença. A neuroinflamação, uma resposta inflamatória no sistema nervoso central, é desencadeada pelo dano neuronal. As células microgliais, que são células de defesa imunológica do cérebro, desempenham um papel crucial na resposta inflamatória e na regeneração neural. Quando ativadas, elas liberam substâncias que podem causar danos nas células nervosas.

As células microgliais podem assumir diferentes estados, M1 e M2, que têm efeitos opostos na inflamação. O estado M1 responde ao lipopolissacarídeo (LPS) em combinação com interferon-g (IFN-g) e produz uma resposta inflamatória maciça, enquanto o M2, geralmente responde a IL-4 e IL-13, com perfil anti-inflamatório. A resposta das células microgliais é influenciada pela composição genética do indivíduo e afeta a capacidade do cérebro de lidar com a patologia amiloide e manter a função normal.

Além das placas, emaranhados neurofibrilares e ativação microglial, outros fatores, como a função vascular, a barreira hematoencefálica, a depuração cerebral, o sistema imunológico periférico e possivelmente a microbiota intestinal, podem afetar o desenvolvimento e o curso da doença de Alzheimer.

Em resumo, a doença de Alzheimer é caracterizada por mudanças nas placas de amiloide β, emaranhados neurofibrilares e ativação microglial. Essas mudanças desencadeiam uma resposta inflamatória no cérebro que contribui para a neurodegeneração. Vários fatores, incluindo predisposição genética, inflamação crônica e estresse oxidativo, desempenham um papel no desenvolvimento e progressão da doença de Alzheimer.

Dados Epidemiológicos

Segundo o último relatório Global status report on the public health response to dementia (2021), da Organização Mundial da Saúde (OMS), estima-se que haverá cerca de 78 milhões de pessoas com demência em 2030 e cerca de 139 milhões, com demência em 2050, sendo a prevalência média global de demência relatada, de 24 milhões. Esses números ressaltam a importância de estratégias preventivas e terapêuticas, incluindo a abordagem nutricional.

No relatório de 2022, a Alzheimer’s Disease International aponta que 75% dos casos de demência não são diagnosticados chegando a 90% em países menos desenvolvidos. Outro número alarmante é de que, em média, 41% dos diagnosticados pela doença não recebem suporte de tratamento pós-diagnóstico.

No geral, o impacto global da demência é substancial e prevê-se que aumente significativamente nas próximas décadas. Embora haja indicações de uma diminuição no número de casos de demência em algumas regiões, a quantidade de casos existentes ainda é alta. Compreender a duração da doença e suas várias fases é crucial para o planejamento efetivo e fornecimento de cuidados para pessoas com doença de Alzheimer e suasuhu famílias.

Nutrição e Alzheimer

A Nutrição desempenha um papel fundamental nos cuidados de saúde e bem-estar das pessoas com demência. No entanto, os pacientes enfrentam vários desafios relacionados à alimentação ao longo do curso da doença.

Nos estágios iniciais, podem surgir dificuldades na compra e preparação de alimentos, falta de apetite e alterações no paladar e olfato. Conforme a demência progride, problemas comportamentais, como agitação e confusão, podem interferir na experiência das refeições. A hiperatividade e a perda de habilidades motoras também podem aumentar as necessidades energéticas. Nos estágios avançados, a fraqueza física, a disfagia e a rejeição de alimentos tornam a alimentação ainda mais desafiadora. É importante abordar essas questões nutricionais para garantir a saúde e a qualidade de vida dos pacientes com demência.

A relação entre a Nutrição e o Alzheimer tem sido objeto de pesquisa científica. Estudos sugerem que o metabolismo da glicose está associado ao desenvolvimento da doença de Alzheimer e que pessoas com glicemia aumentada são mais propensas a desenvolver demência e progridem mais rapidamente do comprometimento cognitivo leve para a doença de Alzheimer. A presença de diabetes tipo II e/ou níveis elevados de glicose no sangue, demonstram ter uma associação com o risco maior de desenvolver a doença de Alzheimer do que pessoas com normoglicemia e sem diabetes.

Um exemplo disso pode ser observado no estudo realizado por Taylor MK et al., onde foram avaliados os efeitos de uma dieta de alto índice glicêmico na agregação de β-amilóide e na função cognitiva de idosos saudáveis. Neste estudo, foi observado que 26% dos participantes tiveram um aumento na carga cerebral de β-amilóide, e isso foi positivamente correlacionado com a ingestão de carboidratos. Além disso, observou-se que o consumo de açúcar foi associado a um pior desempenho cognitivo.

Prevenção do Alzheimer através da Nutrição

Uma alimentação saudável é fundamental para a prevenção do Alzheimer. Recomenda-se uma dieta rica em frutas, vegetais, grãos integrais, peixes, nozes e leguminosas, conhecida como a Dieta Mediterrânea. Essa abordagem alimentar tem sido associada a um menor risco de desenvolvimento de demência e Alzheimer. Além disso, é importante controlar o consumo de gorduras saturadas, gorduras trans e açúcares adicionados, que podem contribuir para a inflamação e o estresse oxidativo, processos prejudiciais ao cérebro.

A ingestão adequada de nutrientes específicos também pode desempenhar um papel na prevenção do Alzheimer. Por exemplo, ácidos graxos ômega-3, encontrados em peixes de água fria, nozes e sementes de linhaça, têm propriedades anti-inflamatórias e podem ajudar a proteger o cérebro. Antioxidantes, como as vitaminas C e E, presentes em frutas e vegetais, também são importantes para combater o estresse oxidativo. Suplementos nutricionais podem ser usados para atender às necessidades e ao estado nutricional, mas não há evidências de que eles realmente possam corrigir o comprometimento cognitivo ou prevenir o declínio.

Nutrição como auxílio no tratamento do Alzheimer

Manter e melhorar o estado nutricional é fundamental para o cuidado de pessoas que vivem com demência, pois a perda de peso e a desnutrição estão associadas à progressão da doença e ao declínio cognitivo. Embora as necessidades nutricionais dessas pessoas não sejam diferentes das da população idosa em geral, é importante garantir uma dieta equilibrada, rica em frutas, vegetais, grãos integrais, laticínios com baixo teor de gordura e proteínas magras. Restrições devem ser feitas em relação a gorduras saturadas, sal e açúcares adicionados.

Uma vez diagnosticado o Alzheimer, a Nutrição continua desempenhando um papel importante no tratamento e manejo da doença. É essencial garantir uma dieta adequada para manter o estado nutricional do paciente e evitar complicações secundárias, como a desnutrição, que comumente acontece em decorrência da menor aceitação, paladar, disfagia, dentre outros.

Dificuldades específicas relacionadas à Nutrição podem surgir à medida que a demência progride e devem ser abordadas de forma individualizada, como:

  • Estabelecer um horário regular de refeições;
  • Planejar e comprar as refeições com antecedência;
  • Considerar preferências alimentares e restrições médicas;
  • Criar um ambiente calmo para as refeições e adaptar os utensílios e alimentos às necessidades da pessoa.

Dependendo do estágio da doença, podem ser necessárias adaptações na textura e consistência dos alimentos para facilitar a deglutição, além de aumentar o aporte calórico em poucas refeições no dia, com o uso de módulos de macronutrientes, por exemplo.

É importante também incentivar a atividade física, garantir a saúde bucal e dentária, também é uma opção oferecer alimentos com sabor forte e aromático, incentivar a alimentação em companhia de outras pessoas e adaptar as refeições para facilitar a ingestão.

Essas medidas podem ajudar a garantir uma ingestão adequada de nutrientes, promovendo a saúde e o bem-estar de pessoas que vivem com demência.

Além disso, alguns nutrientes específicos têm sido estudados quanto ao seu potencial de retardar a progressão do Alzheimer. Por exemplo, a suplementação com ácidos graxos ômega-3, vitaminas do complexo B e antioxidantes pode ajudar a preservar a função cognitiva em estágios iniciais da doença. No entanto, é importante ressaltar que a suplementação deve ser feita levando em consideração as necessidades individuais de cada paciente e não a doença em si.

A relação entre Nutrição e Alzheimer é complexa e multifatorial. Uma alimentação saudável e equilibrada desempenha um papel fundamental tanto na prevenção quanto no tratamento dessa doença neurodegenerativa.

Manter níveis saudáveis de glicose no sangue, adotar uma dieta rica em nutrientes potencialmente protetores e benéficos para o cérebro, além de garantir a ingestão adequada de alimentos são estratégias-chave tanto na prevenção quanto no tratamento dessa comorbidade. Por isso, o acompanhamento de um Nutricionista é essencial para a orientação personalizada, adaptada às necessidades de cada indivíduo, contribuindo assim para uma melhor qualidade de vida e bem-estar dos pacientes com Alzheimer.

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