O rim humano é um órgão complexo com aproximadamente 1 milhão de néfrons, cada um composto por glomérulos e segmentos tubulares subsequentes. Os túbulos renais são responsáveis por conservar água e os solutos do filtrado glomerular, além de manter o equilíbrio ácido/base. As necessidades metabólicas e a preferência de substrato (por exemplo, glicose e ácidos graxos) variam dependendo do segmento tubular específico.
Esse órgão pode sofrer lesões agudas por isquemia, toxinas, drogas e infecção ou pode estar cronicamente prejudicado por diabetes, hipertensão, glomerulonefrites ou lesões renais agudas graves. Os túbulos renais, particularmente os túbulos proximais, são vulneráveis tanto a lesão renal aguda (LRA) quanto a doença renal crônica (DRC). Há fortes evidências de que o metabolismo tubular renal está alterado nessas duas condições e evidências emergentes sugerem que a correção de algumas dessas alterações metabólicas pode atenuar a lesão ou melhorar a recuperação.
Metabolismo Renal
Oxidação de ácidos graxos
As células primárias responsáveis pela grande capacidade de reabsorção do rim são os túbulos proximais, que recuperam cerca de 70% dos solutos filtrados e da água. Para facilitar essa grande quantidade de transporte de água e soluto, um grande número de transportadores que consomem ATP são necessários. Mitocôndrias abundantes estão presentes nos túbulos proximais para gerar o ATP necessário. Semelhante ao cardiomiócito metabolicamente ativo, o túbulo proximal depende da oxidação de ácidos graxos porque esta fonte de energia fornece 106 unidades de ATP em comparação com 36 do metabolismo da glicose. A maior parte do rim externo, ou córtex, é composta de túbulos proximais e os primeiros estudos mostraram que dois terços do consumo de oxigênio no rim humano vêm da oxidação de ácidos graxos nessa região.
Metabolismo da glicose
O rim é um órgão importante para a reabsorção, produção e utilização de glicose. A maior parte da glicose filtrada, um total de 180g por dia, é recuperada por um dos dois cotransportadores de glicose dependentes de sódio (SGLT) localizados na superfície apical do túbulo proximal.
Os estudos iniciais medindo as concentrações de glicose nas veias e nas artérias renais não encontraram muita variação líquida no rim. No entanto, estudos usando glicose marcada isotopicamente mostraram que o rim tanto produz quanto metaboliza quantidades consideráveis de glicose. Abordagens semelhantes em humanos mostram que o rim é responsável por aproximadamente 25% de toda a glicose liberada na circulação.
Em pacientes diabéticos, há evidências de que a gliconeogênese é regulada positivamente tanto pelo rim quanto pelo fígado. Esses achados sugerem que a gliconeogênese renal pode contribuir para a hiperglicemia nesses pacientes.
Para pacientes diabéticos com doença renal crônica, essa perda da atividade gliconeogênica renal provavelmente contribui para episódios de hipoglicemia, além da redução da depuração de insulina que resulta da função renal prejudicada.
Após a lesão renal aguda e a doença renal crônica, a lesão mitocondrial e a redução da disponibilidade de nutrientes alteram significativamente o metabolismo tubular. Estudos recentes forneceram informações sobre as maneiras de mitigar a lesão tubular por meio de alterações na função metabólica ou mitocondrial, sugerindo a importância do metabolismo na lesão renal e na progressão da fibrose. No entanto, estudos adicionais são necessários para entender melhor como o metabolismo tubular pode ser modulado para melhorar a resposta à lesão renal.
No rim lesado, há um aumento da glicólise devido ao aumento da gravidade da lesão. No entanto, ainda não está claro se a glicólise é uma estratégia metabólica adaptativa para gerar ATP no contexto da energia mitocondrial e hipóxia ou resposta desadaptativa. Por fim, o papel da oxidação da glicose nessas patologias renais é amplamente inexplorado, exceto por um estudo que apoia um papel protetor para a oxidação da glicose na lesão renal aguda induzida por cisplatina.
A flexibilidade metabólica entre a oxidação de ácido graxos e da glicose é importante na lesão cardíaca e pode ter um papel protetor no rim. Um melhor entendimento sobre quais alterações metabólicas na lesão tubular renal são protetoras e quais são prejudiciais levará esperançosamente a novos caminhos terapêuticos para tratar tanto a doença renal crônica quanto a lesão renal aguda.
Referências:
1- Marton, A.; Kaneko, T.; Kovalik, J.-P.; Yasui, A.; Nishiyama, A.; Kitada, K.; Titze, J. Organ protection by SGLT2 inhibitors: Role of metabolic energy and water conservation. Nat. Rev. Nephrol. 2021, 17, 65–77;
2- Simon, N.; Hertig, A. Alteration of Fatty Acid Oxidation in Tubular Epithelial Cells: From Acute Kidney Injury to Renal Fi-brogenesis. Front. Med. (Lausanne) 2015, 2, 52;
3- Nieth, H.; Schollmeyer, P. Substrate-utilization of the Human Kidney. Nat. Cell Biol. 1966, 209, 1244–1245;
4- Wright, E.M.; Hirayama, B.A.; Loo, D.F. Active sugar transport in health and disease. J. Intern. Med. 2007, 261, 32–43;
5- Turner, R.J.; Morán, A. Heterogeneity of sodium-dependent D-glucose transport sites along the proximal tubule: Evidence from vesicle studies. Am. J. Physiol. Physiol. 1982, 242, F406–F414;
6- Kang, H.M.; Ahn, S.H.; Choi, P.; Ko, Y.-A.; Han, S.H.; Chinga, F.; Park, A.S.D.; Tao, J.; Sharma, K.; Pullman, J.; et al. Defective fatty acid oxidation in renal tubular epithelial cells has a key role in kidney fibrosis development. Nat. Med. 2015, 21, 37–46;
7- Gewin, Leslie S. “Sugar or Fat? Renal Tubular Metabolism Reviewed in Health and Disease.” Nutrients 13.5 (2021): 1580.