Depressão e Nutrição

Depressão e Nutrição

A depressão é um transtorno mental amplamente reconhecido que afeta milhões de pessoas em todo o mundo. Como não tem uma única razão para seu acontecimento, é descrito como multifatorial, onde itens como um histórico familiar de depressão, eventos traumáticos (morte, perda de um ente querido e abusos), falta ou redução de apoio social, sobrecarga, problemas financeiros, dificuldades interpessoais e conflitos, são exemplos de estressores que podem desencadear um quadro depressivo.

Sua prevalência está em indivíduos na faixa etária de 18 a 29 anos, sendo três vezes maior do que em indivíduos com 60 anos ou mais, sendo as mulheres as mais afetadas.

Atualmente, existem documentos que fornecem subsídio suficiente para classificar e auxiliar no diagnóstico e tratamento de transtornos mentais. Um deles, foi publicado pela Associação Americana de Psiquiatria (APA), sendo intitulado como: Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM 5, versão mais atualizada).

Ele é o dispositivo oficial para traçar os diagnósticos psiquiátricos nos Estados Unidos, sendo utilizado em grande escala no mundo e, tendo assim, grande influência sobre a Classificação Internacional de Transtornos Mentais da Organização Mundial de Saúde (OMS).

Tal manual classifica os transtornos depressivos em:

1- Transtorno disruptivo da desregulação do humor;

2- Transtorno depressivo maior;

3- Transtorno depressivo persistente (distimia);

4- Transtorno disfórico pré-menstrual;

5- Transtorno depressivo devido a outra condição médica.

As características em comum desses transtornos são: tristeza, vazio ou humor irritável, acompanhados de alterações somáticas e cognitivas que afetam significativamente a capacidade funcional do indivíduo.

Contudo, de acordo com tal manual, a depressão na sua forma clássica, é classificada como Transtorno Depressivo Maior (TDM). Para receber um diagnóstico de TDM de acordo com o DSM-5, um indivíduo deve apresentar cinco ou mais dos seguintes sintomas, diariamente, durante pelo menos duas semanas:

  • Humor deprimido na maior parte do dia, quase todos os dias;
  • Diminuição do interesse ou prazer em atividades anteriormente agradáveis;
  • Ganho ou perda significativa de peso;
  • Insônia ou hipersonia;
  • Agitação ou retardo psicomotor;
  • Fadiga ou perda de energia;
  • Sentimentos de inutilidade ou culpa excessiva;
  • Dificuldade em concentrar-se ou tomar decisões;
  • Pensamentos de morte ou suicídio.

Esses sintomas devem causar sofrimento significativo e afetar a capacidade funcional do indivíduo. É importante ressaltar que o diagnóstico da depressão deve ser realizado por um profissional de saúde mental qualificado.

Pesquisas têm sugerido que um fator que contribui para o desenvolvimento e progressão da depressão, é a inflamação. O sistema imunológico e o sistema nervoso estão interligados e a inflamação crônica pode afetar o funcionamento do cérebro. Tal fato é conhecido como a teoria da “inflamação cerebral” da depressão.

Quando ocorre uma inflamação no corpo, as citocinas inflamatórias podem cruzar a barreira hematoencefálica e afetar o funcionamento cerebral. Isso, pode acabar levando a sintomas de depressão, como: cansaço, alterações de humor e distúrbios da qualidade de sono. Além disso, a inflamação pode reduzir a produção de neurotransmissores importantes, como a serotonina, que desempenha um papel fundamental no controle do humor.

Predisposição genética

A predisposição genética, uma deficiência monoaminérgica (por exemplo, de serotonina, noradrenalina e dopamina), a desregulação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA), a diminuição da neuroplasticidade, a perturbação do ritmo circadiano e doenças cerebrovasculares também podem contribuir para o transtorno depressivo.

Além disso, a doença inflamatória intestinal, asma, artrite reumatóide, diabetes mellitus e câncer são exemplos de processos inflamatórios sistêmicos que podem aumentar as respostas inflamatórias a nível cerebral, desempenhando um papel fundamental no desenvolvimento da depressão.

A inflamação também está envolvida na fisiopatologia de vários outros distúrbios neurológicos que apresentam altas taxas de comorbidade, como doença de Alzheimer, doença de Parkinson, esclerose múltipla, doença de Huntington, acidente vascular cerebral e até mesmo, enxaqueca.

Foram encontrados dados em uma metanálise de Köhler CA et al., 2017, níveis periféricos de marcadores inflamatórios, como proteína C reativa (PCR), IL-6, IL-10, IL-12, fator de necrose tumoral-α (TNF -α), receptor solúvel de IL-2 (sIL-2R) e antagonista do receptor de IL-1, significativamente maiores em pacientes com depressão do que em controles saudáveis, o que respalda a hipótese da inflamação estar relacionada ao processo depressivo.

Sendo assim, um cuidado especial com a alimentação, pode auxiliar na redução de processos inflamatórios e reduzir as chances de desenvolver ou mesmo tratar a depressão. Uma dieta rica em nutrientes essenciais pode ajudar a regular o funcionamento do cérebro.

Alimentos saudáveis ou mediterrânicos

A adesão a padrões alimentares saudáveis ​​ou mediterrânicos (com elevado consumo de frutas, vegetais, nozes e legumes; consumo moderado de aves, ovos e laticínios; e apenas o consumo ocasional de carne vermelha) tem sido cada vez mais associado a um risco reduzido de depressão.

Em contrapartida, existem alguns mecanismos pelos quais um elevado consumo de carboidratos, por exemplo, ​​pode aumentar o risco de depressão e ansiedade. Aumentos e reduções rápidas e repetidas da glicemia, parecem aumentar a incidência de sintomas depressivos e alterações no humor.

Na verdade, efeitos inflamatórios provenientes de uma dieta rica em calorias e gorduras saturadas foram propostos como um mecanismo através do qual a dieta ocidental pode ter efeitos prejudiciais na saúde do cérebro, incluindo declínio cognitivo, disfunção do hipocampo e danos na barreira hematoencefálica.

Além disso, a microbiota intestinal também tem sido associada a quadros depressivos. Ela interage com o cérebro de maneira bidirecional, usando vias de sinalização neural, inflamatória e hormonal, modulando processos que regulam as emoções no cérebro humano.

Dessa forma, alguns nutrientes-chave, podem ser fortificados na dieta, de forma a prevenir e/ou tratar quadros depressivos, sendo alguns deles:

  • Antioxidantes: Vitaminas C e E, são antioxidantes que ajudam a proteger o cérebro do estresse oxidativo, que pode estar relacionado à depressão;
  • PUFAs: são ácidos graxos poliinsaturados que apresentam efeitos pleiotrópicos na estrutura e função neuronal, tendo efeitos anti-inflamatórios, modulando vias neuroendócrinas e ativando neurotransmissores essenciais, o que pode contribuir para a prevenção da depressão;

O consumo de PUFA ômega-3 em níveis mais baixos, está associado a um maior risco de tentativas de suicídio e a um episódio de depressão maior;

  • Vitaminas do complexo B: as deficiências de vitaminas B, especialmente de B1, B6, B9 e B12, têm sido associadas à depressão, pois são essenciais para a função neuronal, tendo também um efeito protetor contra a hipercisteinemia, associado a um risco aumentado de transtornos de humor;
  • Vitamina D: é um potente regulador da produção de substâncias neurotróficas, como o fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF), a neurotrofina (NT)-3 e o fator de crescimento nervoso (NGF), desempenhando um importante papel modulador na regulação das vias imunoinflamatórias, que são importantes na fisiopatologia da depressão;
  • Minerais: magnésio, zinco, ferro, cobre e selênio, são nutrientes essenciais na regulação da função celular e na neuromodulação, bem como na atividade antioxidante.

Níveis insuficientes de magnésio podem induzir à alterações no funcionamento do sistema nervoso central, afetando especificamente a transmissão glutamatérgica no sistema límbico e no córtex cerebral. Essas regiões do cérebro são críticas na fisiopatologia da causa da depressão;

Já o zinco, tem capacidade de influenciar a regulação hormonal, incluindo os níveis de cortisol, a resposta imune celular, a neurogênese, a plasticidade neuronal e a expressão de BDNF no hipocampo e no córtex, auxiliando no tratamento do quadro depressivo;

Por sua vez, o selênio é um oligoelemento necessário para o bom funcionamento de diversas selenoproteínas, incluindo aquelas envolvidas na defesa de antioxidantes no cérebro e no sistema nervoso. Além disso, ajuda a proteger as células do dano oxidativo, que pode levar à inflamação e doenças, incluindo as neurológicas.

Em alguns casos, a suplementação de nutrientes específicos pode ser uma parte importante do tratamento da depressão, especialmente quando existe deficiência desses nutrientes. É importante ressaltar que a suplementação deve ser feita sob orientação nutricional, pois o excesso de certos nutrientes pode ser prejudicial.

A depressão é um transtorno mental complexo que pode ser influenciado por fatores como inflamação e nutrição. A compreensão dos aspectos técnicos desses tópicos pode ajudar na prevenção e no tratamento eficaz da doença, oferecendo aos indivíduos uma abordagem multiprofissional, englobando seu cuidado integral, individualizado e que favoreça a sua saúde mental e física.

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